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Reflexos da pandemia para o produtor e indústria

Reflexos da pandemia para o produtor e indústria

Especialista faz análise exclusiva sobre mercado de lácteos para ABCBRH

A pandemia do Covid-19 pegou o mundo de surpresa. Começou de mansinho, parecia distante, lá na China. Em pouco tempo atravessou fronteiras do Oriente e chegou ao Ocidente. Enquanto não há vacina para prevenir a doença, as melhores medidas de combate são a higiene frequente, o distanciamento social, a quarentena. Em alguns locais, foi preciso adotar uma medida mais rígida, o chamado lockdown, termo em inglês que significa paralisação total. E são essas medidas que tem colocado a economia de vários países em alerta.

Dentre as atividades que não podem paralisar está o Agro. Estamos vendo com frequência a expressão: o AGRO NÃO PARA. E assim é com a atividade leiteira. As vacas não param de produzir. Diferente de alguns países, a indústria brasileira não parou e os produtores não precisaram jogar o leite pelo ralo. Um alento para uma cadeia que sofre frequentemente com a instabilidade.

Mas como essa cadeia estava quando a pandemia chegou e como está a enfrentando? O Administrador Enio Andrade, com 30 anos de atuação no mercado lácteo e atual Gerente de Suprimentos Lácteos de cooperativa com indústrias no Paraná e em São Paulo, comenta que no primeiro semestre de 2019 os produtores brasileiros recuperaram os preços recebidos e o custo de produção esteve menor que em períodos anteriores, algo que se inverteu um pouco no segundo semestre e com o crescimento da produção total. Do ponto de vista da indústria, principalmente leite UHT, Andrade aponta que ela operou com margens negativas e dificuldades financeiras diante de preços estabilizados e um grande poder de negociação por parte do atacado, comprimindo cada vez mais a relação comercial.

O mercado brasileiro aguardava otimista por 2020. O gerente expõe que as reformas políticas em curso, a redução do nível do desemprego e consequente maior consumo das famílias, o câmbio estável estimulando as exportações, as importações dentro de uma faixa de controle, geravam uma boa expectativa quanto o aumento de produção e recuperação de margens em relação a 2019.

Ninguém estava preparado para enfrentar os reflexos do Covid-19. Enio aborda que os mercados lácteos europeus e norte-americano tiveram problemas nas exportações devido a redução da demanda, visto que são países exportadores e tem como base de consumo o leite pasteurizado com shelf life (vida útil) de até 15 dias. Com maior volume disponível no mercado interno, somado aos efeitos da pandemia, houve registros de produtores descartando leite.

Já no mercado canadense, que utiliza as importações como forma de equilibrar a produção de lácteos, houve menos consequências para os produtores. Andrade destaca que ações governamentais foram importantes para evitar o descarte como a transformação do excedente em queijos e leite em pó.  “Os resultados foram menos danosos aos países importadores de lácteos do que para os exportadores”, afirma.

O especialista salienta que o Brasil, que é importador de lácteos, com um volume médio de 92 milhões de litros de leite equivalentes importados por mês em 2019, vem enfrentando grandes oscilações de preços em todos os elos da cadeia (produtor, indústria, atacado e consumidor final). Ele explica que o mercado tem um volume disponível relativamente estável para cada habitante, resultado da soma de todo leite produzido somado às importações, menos consumo e menos exportações.

Pequenas variações nesta equação têm impacto direto nos preços dos principais produtos lácteos como os queijos (muçarela e prato), leite UHT e leite em pó, que correspondem para destinação, pouco mais de 60% de todo o leite produzido no Brasil. “A interferência do câmbio dificultando as importações, entressafra em todos os estados produtores (fevereiro a junho) pelo lado da oferta, e o aumento de consumo no início do “fique em casa” e de exportações estáveis, levou a variações de preços em todos os elos”, assegura.

Para Enio, é difícil estabelecer estratégias ou um cenário otimista/pessimista para o futuro.  Não se sabe qual será o impacto do desemprego e fim do auxílio emergencial no poder de compra da população, pelo lado da demanda o aumento na produção a partir de julho e sua relação com as importações. Em tempos de instabilidade, o gerente garante que o melhor para o produtor é buscar segurança e não o mercado especulativo.

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